O Amor de Ele e Ela ou como salvar uma alma da calçada - parte final
Pois bem, ponho o sim pelas mãos que me guiam nessa invernada de distância - de larga semana que pra nós já se conta em passada fita - volto com Ela, não mais peregrina e tão pesada como o aquele encorpado de andante triste do princípio do contado. Vou dizer o do que disseram, não o do dizer do visto com meus incólumes olhares. Mulher de meu irmão, companheira dele e ele dela que são os dois, parentes, próximos de boca e língua, confiáveis, deu-me em bandeja, de bico falado, o caso para completar aqui o por mim e os meus presenciados. Então, neste a seguir, nos acontecidos e acontecendos, já estamos daqui em diante combinados e sabidos. Lá, nesta parte daqui eu não estive, não estou e nem estarei, por assim escrever. Acordados?
Depois de anos, talvez três, talvez, completados agora neste dezembro próximo, passado, em casa de meu irmão, novamente com minhas ricas e preciosas extensões (da parte cabida nessa ciência) em rebentos de alegrias, e sem saber e querer, a pessoa de Ela entrou na conversa. E dito isso, fui averiguando os dizeres dessa alma boa que gerencia a vida de meu irmão, que jamais seria capaz de aumentar ou diminuir o fosse do que fosse. Nunca!
Entusiasmada me contava Dona Luci, do feito de Ela para as bocas daquela gente lá da minha terra, que agora era obrigada a beber do bafo de cachaça de Ela, porque a danada não mais vivia em calçada que fosse, e nunca mais deitaria num nível de cão! Logo, as pessoas que a encontravam, agora não tinham como lhe pisar ou chutar, porque, embora, continuasse a beber (a até então desquerida, desprezada), doravante andava num salto de alto que bastava estender as mãos e já alcançava a todos num mesmo nível de olhar que toque-toque nem careceria. Não era mais necessário ser esmurrada, chutada, acordada pela língua dos cães... Não! Ela, pois sim, neste atual tempo que escrevo, dorme em cama, viva no alto, possui (de posse do que lhe é seu e nunca foi de cachorro nenhum) outra vida. E casa, sua casa agora é outra, literalmente. Muros em enormidade, grades, jardins... Pasme, até calçada! Isto! Mas para desfilar sob olhares da gentelha da vizinhança, e nunca cair e nela deitar como antes. Eta, mulher, danada! Plantou até horta de verdura, tudo bem verdinho e fresco de água derreter da boca:
- Vai lá em casa, Luci, vai! Vai ver que horta bonita eu fiz...
A Luci foi, entrou, conheceu a vasta casa (do ponto de pobre, não precisava melhor), tudo organizadinho: quarto para o filho, quintal grande e cimentado (pra evitar o barro vermelho do encardido da terra), quarto seu com uma espécie de suíte, casinha pro cachorro com ele acorrentado ali perto, vigiando a entrada, tudo direitinho de maravilha. Nada fora do normal de gente de bem como deveria ser a todos, nos sempres dessa vida...
(E o seu filhote? Aquele menino arranjado? Feliz, tá todo feliz, todo feliz, todo ele, o menino é um todo esse danado. Arranjou até mais mãe pra cuidar dele de beijo e tudo! Agora, têm duas, duas! )
Mas, Ela continuava com uma garrafa nas mãos, nas mãos, uma garrafa, agarrada nela. Todavia, toda, o seu jeito completo, era um outro de outro, que ninguém vivo, vendo-a em gente, dos dali queria crer naquele visto atual, testemunhado e apalpado de fato.
(Esse ou isso pode ter sim, um aumentado ou um diminuído, porém a verdade transcrita aqui, mesmo sem relevo para tato, pode sim ser cotejada ainda no acontecendo do hoje!)
- Sabe por quê disso, Carlos? Hein?! Sabe?! Não sabe?!
O riso da alegria do contar, mesmo sendo felicidade alheia, pra quem é de bem, cria-se certo alvoroço na expressão saltada de olhares e rugas interinas, que nos deixa no ar um certo de gozo, recatado, e faz até a história se retardar em comoção. Ficamos todos, eu e os ouvintes, muito, demasiados, e plenos de interesse. Pois sim, pois sim, a mulher do tostão de real que nunca foi achada por interesse de apostador nessa vida, foi alvo de paixão fulminante de um forasteiro! Eta, mulher!
(E não pensemos, eu e tu que me lês, que o caboclo seja sujeito feio, devastado pelo tempo ou que for. Não, Não! O rapaz de bem meia idade, vestido em diferenças financeiras, nunca foi apanhado e nem mal acabado; estava sim, um pouco mastigado, também pelo incômodo da bebida. Nada que uns abraçados femininos de um novo amor não lhe pusesse em linha geral de gente.)
Assim, assado, Ela se emplacou com Ele. A mãe do homem, a sogra, também idem, fulminada pelos amores da nora com seu rebentão, se agarrou nesses dois... digo, nesses três (tinha o menino...), toda redonda de felicidade, estão felizes lá, muito felizes para sempre. para sempre. Felizes, e isto fica até muito redundante de tanta alegria, alegria de tanta felicidade redonda, redonda, redonda, redonda dessa vida. Felicidade redonda, redonda.
Moacyr Scliar: Ciumento de carteirinha
Há 5 anos
Um comentário:
HOMENAGEM AO ESCRITOR DAS "HORAS VAGABUNDAS"
Que tal um cineminha com filmes do Cacá?
Diegues, claro... Mas, indo da sétima arte para outras artes sempre fazendo arte está um outro Cacá, cuja sensibilidade me toca quando nas horas vagabundas, (plagiando o autor), me deixo ao leu de suas palavras...
Que tal um Dosto, mais especificamente Crime e Castigo, Crime é não ler um livro desses, mesmo que seja em um Grande Sertão Veredas ou mesmo em Os Sertões e que escritor escreveu Sertões, um engenheiro militar, imagina se fosse escritor!!! Quanto ao Cacá que não conheço ainda a magnífica pessoa em Pessoa, faço o mesmo comentário, sendo produtor cultural imagina se fosse escritor!!!
Com sua pena eletrônica, faz as Vidas Secas mais magníficas, O Banqueiro Anarquista ser um banqueiro benevolente um homem de bem, não um homem de bens... Mas, de Pessoa e de pessoas Cacá as descreve de forma a deixar Balzac sem sua Mulher de Trinta Anos, ele dá a essa um ar de vinte com a sabedoria e sensibilidade de uma de sessenta.
Trata com sensibilidade também os Humilhados e Ofendidos e com sua poderosa e aguçada sensatez da descrição dos sentimentos descreve como um Racine os mais belos teatros.
Monta seus textos como um Eisenstein junto com a sensibilidade de um Tarkov, Ele e Ela na dialética do sentimentos.
Escrito por O Mosquitinho às 13h53
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