Outro dia, num velório no interior aqui de São Paulo, enquanto aguardava o horário do enterro de uma pessoa muitíssima querida de minha sobrinha e nossa, da minha família, fui surpreendido por algo intrigante numa estrutura de ferro e lona (arquitetura?) que protegia a todos de um sol ardente de domingo, naquela Piracicaba tranquila. As pessoas ficam olhando o nada, o vago enquanto se arrumam com o seco de uma lágrima, na espera do momento de se encerrar aquele ciclo da vida... E todos esperam algo que já não virá mais nesse mundo, e esperam, esperam e continuam lá naquele choro do fim.
Nesses episódios de morte e afins não importa coisa de sangue ligando na gente, se há ou não, importa a tristeza exposta, jorrada nos ares. Ademais, a morte é um baque seco e quem está próximo, seja em que circunstância for é atingido. Guardadas as devidas proporções.
Mas voltando no nada do vago dos olhos a esmo num infinito de esperas, de quando se busca ganhar tempo, pra fugir do tédio oco do novamente “nada”, a gente passeia os olhos vagabundos por tudo que há à frente enquanto por ali e lá se vaga. E assim, naquele dia , pego pelo acaso das calças que para Piracicaba me levou por diversas vezes, olhei, re-olhei a cobertura daquele velório acima da minha cabeça... À primeira vista, um galpão, coberto de lona plástica ou vinil, sei lá, bem alto, pra cima de uns sete ou oito mais metros, com as devidas salas de abrigo dos corpos em vela e flores e lágrimas numa das laterais... A área “livre” desse galpão era uma verdadeira plataforma. E olhando bem, a estrutura de ferro que sustentava o tal galpão era formada por hastes de ferros bem distribuídas no seu centro, cujas pontas terminavam em “duas” pontas abertas, “abrindo-se” como asas para segurar aquele telhado que poderia voar a qualquer instante, se uma tempestade daquelas homéricas por ali passasse. Pois bem, essa estrutura me pareceu familiar, muito! Dos meus tempos de Minas lembrei-me, cavando a cova das lembranças...
Outra coisa me chamou atenção, combinando com o restante daquela “plataforma”, eram os bancos de estrutura de ferro e com madeiras envernizadas, distribuídos ao longo daquele abrigo, de forma simétrica, em torno das hastes do centro, como se fossem exatamente os bancos de uma estação de trem. Isso estava claro, como aquele sol que nos iluminava, estávamos, eu e aquele povo todo numa estação de trem! cuja passageira dormia suavemente, calma, hirta, aguardando a sua hora de partida em definitivo.
O que um pobre de um vivo pode oferecer a um morto, me pergunto, como último agrado? Além, é claro, de um caixão, velas e flores... Uma poesia distribuída em colunas de ferros, com asas abertas que sustentam uma lona paupérrima de um velório municipal? Talvez algum olhar distraído como o meu consiga se perder ou desprender num telhado desses. Talvez. E eu pensei no autor, naquele arquiteto - que não descobri ainda o nome – que “com o que tinha na mão”, digamos assim, construiu o máximo com o mínimo. Imagino se lhe dessem mármore e/ou granito.
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