Os Mayas - em 24
pedras
O sol de domingo é o melhor sol do
mundo, e nele me deito e me rolo de rir ou de chorar. Isso se for pra
ser. Assim que num domingo de outro dia, deste mês de agosto passado
agorinha, dia dos pais, fui à Oca, no Ibirapuera, ver a exposição dos Mayas...
Um Parque quase ermo... Desci a Sena
Madureira a pé (em direção a ele), levando uma garrafinha de água, para o caso
de alguma sede previsível. E como não precisa ser nenhum sábio, água em dia de
calor é mais que bem-vinda para se matar a sede e, também no caso de haver
algum principio de incêndio, pois nunca se sabe... De repente o bombeiro pode
demorar, daí nossa chance de nos tornarmos um herói. Ops,
isso aqui era para falar dos Mayas e, já estou me desandando por outro caminho.
Voltemos ao início. Na porta. En la puerta.
Como era um domingo com pouco público,
lá cheguei e fui entrando... Ops, de repente alguém falou:
- Não pode entrar com a garrafa!
- Sim, tá bom... Eu disse.
Fiquei procurando um jeito de preservar
a garrafinha de água para a volta, na saída, mas não aparecia nenhuma ideia
brilhante... Nisso, outros monitores, guardas e afins, uns 5 ou 6 e outros mil,
talvez, quase todos em coro único dissonante, também insistiram, num
berro:
- A garrafinha... Não pode
entrar!!! E desta vez, aquilo me pareceu muito rude, ou enérgico, mesmo. Bem,
não sei a diferença, mas era algo assim bem chato de se ouvir.
Eu revidei, não na moeda dessa altura
da minha referida menção, mas revidei. Dei no olho deles, dos famintos lobos
daquela portaria quase desértica de um domingo de dia dos pais... Na ausência
de carneiros, lobos devoram grilos.
Assim, como já disse acima, vomitei:
- A garrafinha não contém explosivos!
É água! Não precisam me falar mais, já sei, já sei, não posso entrar com água
na exposição dos Mayas!
Lá se ia a minha chance ou perspectiva
de virar herói no caso de algum princípio de incêndio. Sem água, nessa secura
imensa de uma São Paulo do mês de agosto não daria, ainda que fosse por uma
hora e pouco...
Voltando para o interior. Ou iniciando
o percurso: de 600 a 900 anos D. C., lá desci ao túmulo do sem fim daquela
história mega, faraônica, mística e plena. E pensei: aqueles caras podem ter
dado aula à Shakespeare, talvez; e, também, devem ter exportado máscaras para a
invenção do Teatro Nô (japonês), não sei. Claro, isso milanos (junto assim
mesmo) depois, por aí...
Mas, brincadeiras à parte, eu
mergulhei naquele profundo, e vi maravilhas, terras longes, ermas, povoadas; vi
mares, ilhas, governos e desgovernos, astros, deuses, ritos e... Cacos de uma
civilização inteira, cujas marcas indeléveis, em pedras, perpetuam sabedoria e
tecnologia, avançadíssimas para um tempo do sem fim, um tempo sem medidas...
Talvez, ali, a morte, mais que a vida, esteja muito mais representada, por ser
esta um rito de passagem para um nada (ou tudo) muito, muito além das
compreensões (ou das aceitações).
As diversas faces de uma civilização,
em detalhes nas sobras de esculturas e/ou arquiteturas, ou as próprias
máscaras, são representações grandiosas que nos tocam a alma e o espírito, ou o
insondável, intocável. Seriam aquelas peças o “cinema” daquela gente, que ao
seu modo vasculhavam os longínquos dos tais mistérios acerca da morte, para
perpetuar a vida? Se o cinema, no seu estado em que o conhecemos é uma imitação
quase perfeita da vida, para nos deixar vivos (postos num tempo), para os
Mayas, suas grafias muito provavelmente são representações para os perpetuar (e
perpetuou) num sem fim da vida. Na terra e no espírito humano. Enquanto
houver essa espécie que denominamos homem.
Voltando ao cimo da saída daquela
exposição, sedento que estava da minha garrafinha de água... Não, não havia
mais garrafinha de água e nem ao menos um local onde se pudesse obter uma.
Enfim, a sede e a água: um estado e uma coisa, da vida. Apenas isso.
Mas o forte, o indelével, o cortante,
o fundo, o ensimesmado de mim, era o que era daquele mais que um quê de um
turbilhão de lembranças das nossas próprias ruínas, ali, naquele subsolo da
Oca, em pedaços de pedra, que juntos, como numa fita, formam imagens que formam
um filme, um filme que fica repetindo na nossa cabeça, como o eco de um grito
ensurdecedor... Apenas isso. Mais nada.
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